Estou neste momento me preparando para embarcar para Atenas, Grécia, para o Fórum de Governança da Internet. A impossibilidade do Ministro Gil em se ausentar do País no momento determinou que a incumbência de participar deste evento que inaugura o IGF caísse por sobre este blogueiro. Não vou poder votar no Lula no domingo, mas espero bem cumprir minha missão e conto com o apoio da blogosfera.
O evento marcará a inauguração do Fórum de Governança da Internet, que é uma iniciativa da ONU em resposta às demandas de maior participação global nos assuntos que dizem respeito às diretrizes e políticas que determinam o funcionamento da grande rede mundial. Até hoje esta tarefa foi tocada pelo ICAAN (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers, ou Corporação da Internet para Nomes e Números Designados), entidade sem fins lucrativos ligada ao Departamento de Comércio americano. Tal configuração institucional, apesar de ter realizado até agora um trabalho digno de reconhecimento, começa a experimentar dificuldades em responder às atuais demandas de representatividade e transparência na formulação e condução das políticas de uso e também nas definições técnicas de infra-estrutura que afetam a todos os usuários de forma compulsória.
Há que se considerar que a rede tornou-se instrumento imprescindível para a prestação de serviços públicos por governos e um exemplo que ilustra bem a situação é a declaração de imposto de renda pela Internet, que no Brasil chega a atender a mais de 80% dos casos. Por outro lado é perceptível a tendência da rede em ser 'formatada' por organizações e empresas que atuam na vanguarda da tecnologia, em muitos casos movimentando enormes volumes de capital. É portanto justificável a preocupação da sociedade civil -- e dos indivíduos, governos, e organizações intergovernamentais -- em checar se esta formatação está sendo conduzida de acordo com o bem comum e a universalização dos benefícios trazidos pela hiperconexão.
O coordenador do comitê da ONU que assessora a realização do IGF, o indiano Nitin Desai, em seminário preparatório recentemente ocorrido em Londres (mp3) afirmou que existem tensões sobre a regulação da rede no futuro e também na questão do gerenciamento dos domínios. Em cinco anos existirão muito mais usuários da rede na Ásia do que na Europa ou América, mais páginas em chinês do que em inglês, e o uso da rede nestes locais pode diferir bastante do que hoje ocorre nos países ocidentais. É justo, por exemplo, que estas culturas desejem grafar seus domínios nos caracteres das línguas locais, e no entanto, ao mesmo tempo, parece ser importante para todos que não haja uma balcanização da Internet. Por outro lado, o ataque das teles ao princípio de neutralidade da rede (net neutrality) nos EUA põe em risco a integridade da Internet que nos acostumamos a usar.
É certo que os geeks norte-americanos, aqueles que realmente colocaram a rede para funcionar, temem que a Internet possa algum dia estar subordinada à lógica de governos, e talvez por isso o IGF enquanto evento da ONU seja solenemente ignorado pelos blogosfera nos EUA. Entretanto, para nós aqui no hemisfério sul e ainda toda a turma do continente asiático, não tem a menor graça ter a governança da Internet nossa de cada dia subordinada ao cenário político norte-americano. Especialmente em função da influência exacerbada que o lobby das teles e da indústria cultural (hollywood) tem operado sobre o congresso, de onde saem sérios ataques aos princípios de liberdade da rede.
Nitin Desai avisa que o IGF é um exercício para os atores (stakeholders) deste novíssimo cenário de convergência, e que o evento é "uma porta aberta, uma assembléia onde todas as visões são bemvindas", mas que não se trata de um fórum de decisões. Me parece uma aposta na possibilidade de se criar um modelo de desenolvimento de consensos sobre normas legais para a Internet atraves de um processo deliberativo aberto e informal, no qual o papel da socieade civil não está subordinado a governos. De fato, trata-se de um evento aberto que não privilegia a presença de autoridades governamentais.
Minha missão em Atenas é representar o Gil na Oficina de criação da "Carta dos Direitos da Internet". Trata-se de um movimento iniciado na Cúpula da Sociedade da Informação (WSIS) em Tunis pelo senador 'verde' italiano Fiorello Cortiana que contou com o apoio direto de Gil, além de Lawrence Lessig e Richard Stallman. Ao propor uma abordagem ao nível de princípios e conceitos, a reflexão sobre a 'Carta' pode facilitar o exercicio de consensos sobre o que seria desejável em termos de direitos e obrigações para os usuários do ambiente web.
O site da oficina (tem também um wiki) apresenta algumas questões estruturantes para orientar o debate sobre direitos e obrigações dos usuários da rede, e o site do MinC convida interessados a manifestarem suas apreciações sobre o tema. Estarei reportando direto de Atenas sempre que possível, aqui no ecodigital ou na seção específica no Cultura Digital. Aos interessados vale checar os links e referências sobre o tema.
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