Na rede

sexta-feira, maio 30, 2003

Sem Tesão não há Inclusão: O foco da questão não é a tecnologia

E segue a II Oficina, onde o destaque é a boa qualidade das idéias apresentadas pelos representantes do governo, principalmente os que estão colocados nas posições estratégicas do setor de TI (agora TIC). Sérgio Amadeu (ITI), Rogério Santana (SLTI/MP) e Rodrigo Assumção, seu incansável adjunto e principal motor do evento, me parece um tripé de qualidade para as transformação necessárias no setor.

Na primeira plenária do dia (ontem, 29), o simpático Rogerião Santanão esteve falando sobre e-gov frente a José Eisenberg, Prof. de Ciência Política do IUPERJ. Sua longa experiência à frente da Procergs, acompanhando a experiência gaúcha de software livre e também o desenvolvimento das práticas do orçamento participativo credenciam seu discurso. O fato de determinados serviços de governo estarem já internetizados (receita, eleições, bancos, geralmente tendo como retaguarda sistemas da esfera do controle), enquanto outros permanecem empacados frente ao emaranhado de sistemas que não conversam entre si revela o viés do E-gov, que até hoje desconsiderou a melhoria da qualidade de vida das populações de baixa renda. Santana: "até hoje não existe o cartão único de saúde".

Eisenberg apresentou dados de suas pesquisas sobre ação municipal de inclusão digital, e reforçou a visão de que os serviços preparados para serem disponibilizados não coincidem com aqueles que atingem o maior número de usuários: E-gov hoje não sintoniza com inclusão digital. Apresentou avaliação dos diferentes modelos institucionais das empresas de processamento de dados, comparando a Prodabel (Belo Horizonte, empresa pública), a Procergs (Porto Alegre, economia mista) e o ICI (Curitiba, organização social, resquício da Reforma Gerencial) - este último se mostrando mais ágil na captação de recursos, mas ao mesmo tempo menos trasparente e acessível ao controle social.

O último painel ficou por conta de Cláudio Prado (representando o Ministério da Cultura) e Nélson Pretto (FACED/UFBA), que trouxeram os ventos da Educação e da (contra)Cultura ao evento, até então eminentemente técnico e governamental. Cláudio  (o agitador da Ilha de Wight), encarregado de representar o ministro Gil, falou mas não disse (segundo ele porque não podia) sobre um projeto de implantação de centros de cultura digital. O plano é incentivar a apropriação tecnológica das novas ferramentas de produção de conteúdos digitais (áudio,  vídeo + internet) em localidades com alto índice de exclusão social. Entre outras "visões" Claudio propõe um salto sobre o século 20, este que manteve os frutos do desenvolvimento e do avanço científico distante das massas, para uma aterrissagem digital diretamente no século 21. Implodir o modelo da cultura broadcasting na disponibilização digital das diversas culturas nacionais, irradiando conteúdo a partir das pontas da rede. E para provocar um pouco mais, lançou a frase: "Sem Tesão não há Inclusão".

Nelson Pretto, que também coordena a Biblioteca Virtual de Educação à Distância, do Prossiga, seguiu com o painel avisando que "as redes não conectam espaços virgens" e reclamando da falta de representação do Ministério da Educação ao evento. Ao mesmo tempo em que denunciou a pedagogização da educação e a professoralidade instituída (professor precisa viajar), alertou para o perigo de se criar estruturas paralelas à escola, sugerindo que a Inclusão Digital seja mais abrangente, incluíndo o cidadão e a escola:

"A inclusão digital pode acontecer em um ciberparque localizado no meio do muro que liga a escola à rua, constituíndo um túnel de passagem, o espaço-tempo da produção cultural, onde poderiam se articular comunicação, educação, saúde, ciência, cidadania, tecnologia, etc. Não como algo à parte, mas integrando a formação do cidadão para a construção de uma nação à prova de futuro". Neste sentido convocou o terceiro setor à insistir na parceria com as escolas, e ao Ministério da Educação a se articular com as iniciativas de governo para integrar as ações de inclusão digital.

No fechamento desta blogada, Cláudio Prado ainda tentava, sem sucesso,
que sua frase tesuda fosse incluída no documento final da oficina: "Tucanaram
a inclusão
".

quinta-feira, maio 29, 2003

II Oficina de Inclusão Digital: O grito de guerra do software livre no planalto

A correria é grande, e portanto só agora alguma coisa sobre a II Oficina chega no blog. O primeiro dia (27) não correspondeu às expectativas. Cheguei atrasado e não vi a abertura, mas a ausência dos ministros previstos (Zé Dirceu e Guido Mantega) foi um ponto a se lamentar - o evento merecia maior respaldo do primeiro escalão. Vi a apresentação do Jorge Sampaio do Instituto Florestan Fernandes, que me pareceu legal, mas sem nenhuma sinergia com o representante do Programa Fome Zero. Ou seja, plenárias do primeiro dia passaram em branco. Os grupos de trabalho foram mais interessantes.

O que despertava a atenção hoje (28)* era o atrativo especial chamado Silvio Meira (CESAR / Porto Digital) (foto) que conhece como ninguém as peripécias da arte zen de se produzir software no Brasil, e estaria frente à frente com Sérgio Amadeu, homem forte da TIC governamental, numa conversa sobre Inclusão Digital e Software Livre.

O debate ultrapassou as expectativas, deixando muito claro no entusiasmo de Amadeu que estaremos diante de diretrizes políticas de compras governamentais em TI realmente revolucionárias. É software livre (e não grátis) e ponto. Há que se destacar a lucidez e o refinamento das colocações do Sílvio sobre alguns poréns relevantes na doce visão do Brasil como eldorado do software livre, mas a arrojada empolgação do Diretor do ITI é contagiante.

A primeira palestra do dia já havia surpreendido pela presença de Nelson Simões, da RNP, que apresentou com clareza uma alternativa "à prova de futuro" de como pavimentar as vias que irão possibilitar todo e qualquer projeto de inclusão digital. A opção pela fibra ótica / rede ethernet, acrescida em flexibilidade pela possibilidade wi-fi na chamada "last mile" configura uma combinação eficiente, de baixo custo, e que estaria pronta para a demanda por novas aplicações a ser gerada nas pontas da rede. Muito interessante a ênfase do Neslon de que a rede não pode ser vista como um serviço, e sim como patrimônio a ser gerido pela comunidade usuária. Vale muito estudar a apresentação dele: Redes Comunitárias.

O Marcos Dantas do Min. das Comunicações, que debateu com o Nelson, falou de forma academica e ideologicamente interessante, mas não apresentou nada da posição do Minicom em termos de propostas de otimização de redes e acesso universal, o que seria esperado do representante ministerial. O FUST e suas indefinições alcançou consenso: merece levar um
"boot".

No público presente, boa representação do terceiro setor, das empresas e do governo, apesar da subrepresentação de alguns setores - no geral, grande evolução em relação à primeira oficina. Muito bom conhecer no concreto parceiros de conversas digitais de longo tempo. A turma do Projeto Metáfora, a quem eu já me conectava há algum tempo marcou boa presença (foto), assim como o pessoal do surpreendente Saúde e Alegria, do Sampa.org, continua...

(*) obs: Esta é a blogada de ontem, que não foi publicada porque o link da comunidade caiu por falta de pagamento (!) "Inclusão digital, quem paga a conta?" No caso, eu.

obs 2: o brother duende também está blogando sobre a Oficina lá no CTJovem.

quarta-feira, maio 21, 2003

Zé Dirceu: E-Gov = Inclusão Digital
- Chefe da Casa Civil une TI e Comunicação, agora TIC

Na semana que antecede a II
Oficina de Inclusão Digital
em Brasília, o governo Lula parece
estar apresentando as ferramentas institucionais com que irá gerenciar
os setores de Tecnologia da Informação (TI) e Telecomunicações.
José Dirceu foi arrojado o bastante para sacramentar
uma nova sigla - TIC - Tecnologia da Informação e Comunicação

- que a partir de agora irá aglutinar muitas ações importantes
que andavam dispersas no meio burocrático brasiliense. "A Tecnologia
da Informação e Comunicação se vincula mais a temática
do desenvolvimento e do combate à pobreza do que ao mero debate sobre
soluções de informática
", veja
a íntegra do discurso
.


No último dia 14, na reunião
do Comitê Executivo do Governo Eletrônico
, foram lançadas
as 8 Câmaras Técnicas
que irão propor políticas e coordenar a atuação
do governo em diferentes áreas. A Câmara de Implementação
do Software Livre ficará com o ITI
de Sérgio
Amadeu
(ex-Egov da Prefeitura de SP), que parece ser o homem forte de Dirceu
para coordenar toda a estratégia. Boas sinalizações!


A SLTI,
de Rogério
Santana
, na qual figura também o Rodrigo Assumção (Sampa.org),
coordenará as câmaras ligadas à infraestrutura "dura"
de processamento de dados do Governo: a de Integração de Sistemas,
a de Sistemas Legados e Licenças, a de Infra-Estrutura de Rede e a G2G.
A Câmara de Gestão de Sites e Serviços Online fica com a
Secom/PR, que no governo
passado não assumiu a tarefa, que já era sua, Deus sabe porquê.
Relações Exteriores ira gerir
a Câmara de Gestão de Conhecimento e Informação Estratégica
(?).


A coordenação da Câmara de Inclusão Digital ficou
sem definição, e tudo indica que a Oficina que começa no
próximo dia 27 será um forum importante para diagnosticar os atores
representativos deste contexto. Zé Dirceu afirma que "Governo
Eletrônico é sinônimo de Inclusão Digital
",
e como a oficina tem o patrocínio do Sampa.org
e do RITS, além da SLTI
do Min do Planejamento
, espera-se que a iniciativa possa trazer resultados
sérios - ao menos também aqui temos boas sinalizações.


Vamos estar acompanhando de perto as movimentações relativas
à Oficina, pois tudo indica que o evento repercutirá decisivamente
no ambiente digital nacional.

quinta-feira, maio 08, 2003

A TV Digital do B
- Discurso do Ministro traz boas novidades

O ministro das Comunicações, Miro Teixeira, foi ao Senado ontem
para anunciar a conclusão da minuta de decreto que criará o grupo
de estudo encarregado de analisar a viabilidade da TV digital brasileira. Anunciou
também o uso de tecnologia digital nas transmissões de rádio
em ondas médias (digital
AM standard
- veja também: DRM:
"Why digital AM?")
o que pode ser revolucionário para o setor de radiodifusão. Mas
importante mesmo é a seguinte afirmação do Ministro, que
está hoje em matéria
do Valor
(só para assinantes, agh#*):



"...o modelo de tecnologia imaginado pelo ministério não
está voltado para a TV em alta definição, mas para a
possibilidade de transformar os aparelhos de TV convencionais em instrumentos
para a "inclusão digital", com programas de computador desenvolvidos
no país."



Na mesma matéria, Miro cita a diretriz do MC
em pesquisar dentre as diversas tecnologias que compõem os subsistemas
da DTV, aquelas que são livres para o uso sem o pagamento de royalties.
Esta diretriz antenada com os princípios da Ecologia
Digital
é um excelente input para a tarefa do grupo de trabalho constituído,
que é formado por 11 representantes do governo, do meio acadêmico
e do setor privado. O grupo terá também representantes dos ministérios
da Ciência e da Tecnologia, das Relações Exteriores e do
Desenvolvimento. Terão representantes também a Secretaria de Comunicação
de Governo e Gestão Estratégica, o BNDES, a Finep, e a fundação
CPqD. As universidades envolvidas terão um representante, e, pelo setor
privado, haverá dois integrantes, indicados pelos produtores de equipamento
e pelas emissoras de TV aberta.


Enquanto isso, na terra de Bush, a confusão ainda é grande em
relação ao prazo estabelecido pelo governo (veja "A
Paranóia de Hollywood
") para que sejam cessadas nos EUA todas
as trasmissões analógicas até o ano de 2006 - desde que
pelo menos 85% do público americano tenha adquirido os receptores digitais.
A existência de inúmeros interesses aparentemente contraditórios
criou uma situação inusitada, onde todos os envolvidos acham que
irão perder algo.


Em
"Harry Potter
e os Prisioneiros da Transição para a TV Digital
-
Uma aventura em política de telecomunicações
",
por Mike Godwin da Public
Knowledge
, publicado em Ecologia
Digital
, temos uma interessante análise do quadro atual da questão
nos EUA, e algumas propostas mágicas de solução. A briga
entre os setores envolvidos no negócio é grande, e a análise
de cenário pode ser muito proveitosa para quem acompanha e influencia
o processo brasileiro, agora acompanhado de saudável ideologia.


Havemos de cuidar para que clichês políticos jurássicos
não coloquem o projeto da DTV do B na via do atraso, nos moldes das já
conhecidas "reservas de mercado", e sim na vanguarda da concepção
libertária da rede e seus protocolos abertos.