Na rede

sexta-feira, dezembro 05, 2003

Ambientalismo para a rede: Por uma economia política da propriedade intelectual

Um dos primeiros a destacar a necessidade de uma Ecologia Digital que se aproxima da forma como a concebemos foi James Boyle, do Direito da Duke University. Em seu livro de 1996, "Shamans, Software and Spleens", buscou construir uma teoria social da sociedade da informação. O livro, de fato, expande as idéias apresentadas pela "Declaração de Bellagio", de 1993, que contou com a co-autoria de Boyle:

"A lei de propriedade intelectual contemporânea é construída em torno da noção do autor como um indivíduo, criador original e solitário, e é para este quadro que suas proteções são concebidas. O "autor", neste sentido moderno, é o criador de obras de arte únicas, cuja originalidade garante sua proteção sob as leis de propriedade intelectual -- particularmente as leis de "copyright" e de "direitos de autoria". Esta noção, no entanto, não é nem natural nem inevitável. Ao contrário, surgiu em um tempo e lugar específicos -- a Europa do século 18 -- em conexão com um formato particular de tecnologia da informação -- a imprensa."The Bellagio Declaration (1993 Rockefeller Conference)

De acordo com Boyle (in "The Need for Digital Ecology"), existe hoje a necessidade de um ativismo político sobre a questão da propriedade intelectual, de forma a combater as tendências estruturais do modelo estabelecido para a sobre-proteção dos direitos autorais. O fato é que o tema não tem um lugar correspondente no debate popular ou no entendimento político, e neste contexto é que surge a Ecologia Digital, exercitando uma analogia com o movimento ambientalista de forma a demonstrar como concebermos uma "economia política da propriedade intelectual". Sob o conceito do "ambientalismo", diferentes grupos com diferentes interesses (algumas vezes contraditórios) puderam se organizar em torno de uma ampla coalizão política. É exatamente isto que precisamos agora no tema da mídia digital - uma abordagem política que possa efetivamente defender o domínio público e as liberdades do ambiente digital...

Leia o artigo completo no site Ecologia Digital(agora no Medium, com os links reativados).


Outas Abordagens

Pesquisando a Rede, eis que deparo com mais um colega fazendo utilização do conceito de Ecologia Digital. Neste caso com uma abordagem cognitiva, mais descritiva das características do ciberespaço em sua interface com a educação e o estudo dos processos de aprendizado, e menos ativista no sentido de observar e agir sobre as ameaças às liberdades do ambiente digital:
"A ecologia digital é uma conseqüência da evolução das tecnologias da informação. Nesta ecologia, o conceito de texto escrito é estendido para a noção de hipertexto disponibilizado através de uma rede de computadores.

O princípio da ecologia digital considera a rede como um sistema subsunçor (*), que é capaz de produzir conhecimento à partir de novas informações (novos conceitos) que são ligadas a uma estrutura de conhecimentos anteriores. Vimos na teoria da autopoiese
(**) que o conhecimento é representado por uma estrutura encadeada onde novos conceitos se relacionam a conceitos anteriores. Também observamos que o universo digital é uma estrutura de hiperdocumentos relacionados entre si por hiper-referências. Juntando estas teorias podemos considerar que o ciberespaço é na realidade uma organização de conhecimentos.


Contudo, nesta organização o conhecimento não está retido a uma entidade física, como nas ecologias oral e escrita. Na ecologia digital o conhecimento pertence ao coletivo de sistemas computacionais interligados em rede: o ciberespaço. É neste ambiente que os
indivíduos descobrem e constroem seus objetivos, e se conhecem como coletivos inteligentes
."
in "Educação na Ecologia Digital",Marcelo Pereira Nunes e Lucia Maria Martins Giraffa
* - A teoria autopoiética tem como idéia básica um sistema organizado auto-suficiente. Este sistema produz e recicla seus próprios componentes diferenciando-se do meio exterior. O termo Autopoiese foi criado pelos biólogos chilenos Humberto Maturana e Francisco Varela. A teoria Autopoiética tem sido aplicada em Imunologia, na interação homem computador, sociologia, economia, filosofia e administração pública.
** - A aprendizagem significativa ocorre quando a nova informação adquirida "ancora-se" em conceitos relevantes previamente existentes na estrutura cognitiva do aprendiz. Neste processo, a nova informação interage com uma estrutura de conhecimento específica, que Ausubel chama de "conceito subsunçor", ou simplesmente "subsunçor". Esta palavra é uma tentativa de se traduzir o termo inglês "subsumer".

quarta-feira, dezembro 03, 2003

Anatel consulta sobre o "Serviço de Comunicações Digitais"
- Alguma chance para as Redes Comunitárias?

Está em curso no site da Anatel
a Consulta
Pública 480
, que contém a proposta de regulamento do “Serviço
de Comunicações Digitais Destinado ao Uso do Público em
Geral
” (SCD), e que está aberta a contribuições
da sociedade até 12/01/2004. Decifrando o "anatelês"
(linguagem proprietária), mas louvando a iniciativa da Anatel em propor
uma forma de (bem) utilizar os recursos do FUST (cujo caixa anda perto dos três
bilhões de reais) em projetos de universalização de acesso,
o Sílvio Meira destaca que o Art.
59 seria o ponto nevrálgico da regulamentação a ser discutido:



“Art.59. As concessões deverão obedecer ao Plano Geral
de Outorgas do SCD (PGO-SCD), que definirá a divisão do País
em áreas de prestação, número de prestadoras por
área de prestação, prazos de vigência e prazos
para admissão de novas prestadoras do serviço.”




Já havíamos abordado
anteriormente
o assunto aqui no Ecodigital, quando citamos a palestra
do Nelson Simões
(RNP) sobre Redes
Comunitárias
na II
Oficina de Inclusão Digital
em maio último. Entre outras coisas,
Simões colocava que a rede não poderia ser vista como um serviço,
e sim como um patrimônio a ser gerido pela comunidade usuária.


Vai no mesmo caminho o artigo do Lessig
para a Wired: "Fiber
to the People
". Argumenta, baseado no trabalho
de Alan MacAdams (Cornell),
que as "advanced
fiber networks
" (AFNs) configuram-se como monopólios naturais.
Não significa que só possa existir uma, mas sim que, SE já
houver uma, é muito mais barato simplesmente adicionar usuários
a esta do que construir outra.


A premissa de um "monopólio natural" leva os economistas a
pensarem imediatamente em forte regulação, mas a questão
aqui está mais para o aspecto da propriedade. Se um provedor de
serviços de rede for proprietário de uma AFN numa área
particular, irá cobrar de seus usuários preços monopolistas,
ou restringirá os serviços da rede ao uso de seus produtos monopolistas.
Mas se o usuário for o proprietário da rede, terá o mesmo
acesso a preços muito mais baixos e sem nenhuma restrição.


Seria muito interessante, revolucionário mesmo, se a regulamentação
do FUST prevesse o incentivo à formação de Redes Comunitárias
gerenciadas por conselhos locais. Neste processo, municípios podem ser
convencidos por empresas implementadoras de infra-estrutura a desenvolverem
serviços de rede de alta-velocidade, e então, segundo
Lessig
, aprenderemos novamente porque a General Motors não é
proprietária de ruas e estradas, e porque as empresas de telecomunicações
não devem ser proprietárias do acesso à Internet. Como
diz o Silvio:



"...não custaria nada a ANATEL estabelecer um plano de outorgas
que desse uma no cravo e outro na ferradura: elaborar um plano de outorgas
para o SCD público que contemplasse, ao mesmo tempo, os operadores
das grandes áreas, mas também as redes comunitárias,
que certamente seriam usuárias dos serviços dos primeiros e
que, muito provavelmente, não lhes tirariam mercado, já que
as instituições que normalmente têm a demanda para tal
e energia para atendê-la estão normalmente operando em áreas
e com clientes que as operadoras “normais” não querem nem
ver, quanto mais conectar..."



Todos à consulta
pública da Anatel
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