Tradução livre de trecho do artigo
de Peter Kirn no site Create Digital Music

Em poucas palavras, creio que o novo dispositivo móvel da Apple está causando um imenso dano ao legado computacional que a empresa forjou. Nós poderíamos estar saudando o lançamento de um tablet Mac hoje. Em vez disso, temos um iPhone gigante - e isso é uma decisão que tem repercussões graves. Trata-se de um duro golpe para as alternativas de código aberto, e também para os padrões abertos em geral: o poder da intercombinação de hardware e software, no qual se baseia tudo o que fazemos com a música e a imagem em computadores.
Durante anos a comunidade Mac protestou contra o que era percebido como uma perspectiva fechada da Microsoft. Hoje, muitos destes se encantam por uma Apple que manifesta uma visão muito mais fechada do que a de Redmond. Podemos dizer que o iPad incorpora o oposto exato de tudo relacionado à computação aberta como ferramenta criativa para a criação, compartilhamento e distribuição de música, imagens e conhecimento. Vejamos:
- Trata-se de uma plataforma fechada. Tal como acontece com o iPhone, desenvolver aplicações para o IPAD significa depender totalmente das ferramentas da Apple, e do uso do software e hardware proprietários da Apple apenas para construir um app. Tais sacrifícios podem ser justificados no caso de um grande produto. Mas a questão é que a distribuição das aplicações também depende da Apple, que é quem decide quais os desenvolvedores de aplicações serão autorizados a criar - algo que nunca aconteceu em um sistema operacional de computação. Desde o lançamento do SDK do iPhone, os apaixonados pela Apple argumentaram que de alguma forma isso teria sido uma decisão forçada pelas operadoras de telecom, e que certamente a sua amada a Apple não tinha culpa. No entanto, a Apple escolheu esse caminho para um dispositivo que, apesar de não apresentar um teclado, tem todas as funções de um computador - algo que poderia ter sido um Mac, com todo o poder e a liberdade de um Mac, em vez de um iPhone vitaminado.
- Não tem portas padrão. Tal como o iPhone, o iPad tem apenas um conector proprietário, assegurando à Apple o controle sobre o hardware feito para o dispositivo. Você pode jogar fora décadas de aulas sobre o valor dos conectores padrão, sobre a possibilidade de se utilizar um computador como um hub digital -- para usar uma expressão popularizada pela Apple. Saída de vídeo será possível, ainda que com um adaptador proprietário. Mas o acesso a essa porta de vídeo via software tem sido um enorme problema no iPhone. Além disso, as possibilidades de uso hardware externo não foram totalmente esclarecidas. A Apple vai oferecer um leitor de cartão de memória da placa que usa USB. Mas não há uma porta USB nativa na máquina, e isso não necessariamente sugerem suporte completo para USB, esperemos, mais detalhes surgirão.
- Está ligado ao iTunes. Tal como acontece com o iPhone, você não pode usar o hd do iPad como um hd. Você não pode se conectar a um computador e colocar nele o que você gosta. Você está limitado à utilização de aplicativos como condutores ou servidores - e, mesmo assim, você tem ações limitadas; arquivos críticos de mídia e leitura são controlados pela toda poderosa iTunes App Store. O iPad acaba sendo um dispositivo de armazenamento que você possui, mas que outro alguém controla. Talvez isso seja aceitável para os consoles de jogos, mas, novamente, o iPad tem a aparência de um computador. (Exceto, claro, que na verdade não é.)
- A Apple controla toda a distribuição de mídia. A Apple já tem uma posição perigosamente dominante no mercado de música e software móvel, e seus dispositivos acorrentados ao iTunes garantem que todo o conteúdo passará por sua loja online, pelos seus dutos, enfim, tudo sob o seu controle. Isto significa que os desenvolvedores estarão limitados no que eles podem criar para o dispositivo quando se trata de mídia - um app de streaming da Last.fm é bom, mas uma loja de música independente (como a Amazon MP3 no Android) não o é. Adicione a isto o cenário da Apple dominando a distribuição de livros. No momento em que temos a oportunidade de promover a publicação independente de e-books, surge o iPad acompanhado por promoções de lançamento de grandes editoras tradicionais. O que isso significa para os escritores e produtores de conteúdo independentes? Um sinal positivo é que a aplicação da Apple suporta o formato aberto epub. Nos próximos dias e meses, vamos avaliar como isso funciona, e como interage com outros aparelhos.
- Não é um computador aberto. Não é um Mac. A questão de fundo: você não pode realizar os procedimentos básicos que uma experiência de computação aberta permite. Você não pode conectar o hardware que você deseja, desenvolver ou executar o software que você quer, ou experimentar a liberdade que um computador oferece. Isso não quer dizer que uma tablet, uma slate, uma pad, ou o que você quiser chamá-la precisa ser exatamente como outros computadores. Pelo contrário: se você acredita na experiência de computação, sabe que deve trabalhar os aspectos de design de forma nova e criativa. (Houve um tempo quando o laptop em formato de mala que se fecha foi uma idéia nova, em um tempo em que os computadores eram tijolos gigantes que conectado a uma TV.)
Nota: Em momento algum eu digo que a alternativa a uma iPad tem de ser em código aberto. Sou um grande fã do código aberto e do software verdadeiramente livre. Mas em relação ao que temos acima, o Windows pode ser considerado aberto.