Este é o "chefe", Ministro Gilberto Gil, proferindo Aula Magna de abertura dos Programas 2004/2005 da Cidade do Conhecimento da USP com o título "Cultura Digital e Desenvolvimento". É um texto irado e brilhante - só conferindo:
"...mais interessante de tudo isso é que este movimento (software livre) surgiu na sociedade, e não nas empresas, nos partidos, nas entidades, nos modos de representação ou de organização tradicionais, o que implica uma mudança estrutural, profunda, não apenas de conteúdo, mas de forma, de processo, que se reflete no que se diz, no que se propõe, e também em como se diz, em como se propõe.
Tudo tem acontecido de forma descentralizada, fruto do trabalho coletivo de gente que tem interesses, desejos e bagagens culturais diversas, mas que decidiu trabalhar de graça, dando inclusive um novo sentido à palavra trabalho, para que mais e mais pessoas, no mundo inteiro, possam ser donas de seu destino ou ter uma vida melhor, o que significa, nos dias de hoje, inclusão digital (...)
É com otimismo e alegria que devemos saudar as iniciativas e as experiências de inclusão digital e de adoção do software livre, assim como o debate que se trava sobre os impactos da cultura digital sobre os direitos autorais, com as propostas de novas formas de licenciamento e gestão de conteúdos, a exemplo das creative commons, que abrem perspectivas inteiramente novas, diferentes, oxigenadas, para temas antes prisioneiros das várias formas de ortodoxia analógica.(...)
Atuar em cultura digital concretiza essa filosofia, que abre espaço para redefinir a forma e o conteúdo das políticas culturais, e transforma o Ministério da Cultura em ministério da liberdade, ministério da criatividade, ministério da ousadia, ministério da contemporaneidade. Ministério, enfim, da Cultura Digital e das Indústrias Criativas. (...)
Vocês certamente sabem, mas não custa destacar: existe uma comunidade, uma cultura compartilhada, de programadores e pensadores, cuja história remonta aos primeiros experimentos de minicomputadores. Os membros dessa cultura deram origem ao termo "hacker". Hackers construíram a Internet. Hackers idealizaram e fazem a World Wide Web. E amentalidade hacker não é confinada a esta cultura do hacker-de-software. Há pessoas que aplicam a atitude hacker em outras coisas, como eletrônica, música e nas ciências humanas. Na verdade, pode-se encontrá-la nos níveis mais altos de qualquer ciência ou arte.(...)
Eu, Gilberto Gil, cidadão brasileiro e cidadão do mundo, Ministro da Cultura do Brasil, trabalho na música, no ministério e em todas as dimensões de minha existência, sob a inspiração da ética hacker, e preocupado com as questões que o meu mundo e o meu tempo me colocam, como a questão da inclusão digital, a questão do software livre e a questão da regulação e do desenvolvimento da produção e da difusão de conteúdos audiovisuais, por qualquer meio, para qualquer fim."
A manifestação do ministro é também uma resposta às inúmeras críticas ao projeto da Ancinav, que se misturaram a uma matéria "no mínimo engraçada" no Estadão - "Governo quer controlar conteúdo da internet":
"Ontem, por exemplo, um grande jornal de São Paulo estampou em chamada de primeira página: o Ministério da Cultura quer controlar a Internet. Ora... Isso ofende a minha inteligência, a minha história, a minha sensibilidade. E a inteligência dos próprios leitores."
Valeu chefe! Os cães vão latir, mas a caravana vai passar.