Na rede

quarta-feira, fevereiro 03, 2010

Como um grande produto pode ser má notícia: Apple, iPad, e o Mac fechado

Tradução livre de trecho do artigo
de Peter Kirn no site Create Digital Music

Após revolucionar uma indústria após a outra, a Apple se propõe a revolucionar 3 de uma só vez.

Após revolucionar uma indústria após a outra, a Apple se propõe a revolucionar 3 de uma só vez.


O iPad da Apple chegou
. Ele começa a ser vendido por 499 dólares. Trata-se de um gadget lindo, brilhantemente concebido, e que se beneficia do design inteligente das ferramentas de desenvolvimento de aplicativos para dispositivos móveis da Apple, as melhores da classe. Será uma explosão de vendas. E, infelizmente, para mim isso significa uma má notícia para o tipo de computação criativa sobre o qual falamos neste site.

Em poucas palavras, creio que o novo dispositivo móvel da Apple está causando um imenso dano ao legado computacional que a empresa forjou. Nós poderíamos estar saudando o lançamento de um tablet Mac hoje. Em vez disso, temos um iPhone gigante – e isso é uma decisão que tem repercussões graves. Trata-se de um duro golpe para as alternativas de código aberto, e também para os padrões abertos em geral: o poder da intercombinação de hardware e software, no qual se baseia tudo o que fazemos com a música e a imagem em computadores.

Durante anos a comunidade Mac protestou contra o que era percebido como uma perspectiva fechada da Microsoft. Hoje, muitos destes se encantam por uma Apple que manifesta uma visão muito mais fechada do que a de Redmond. Podemos dizer que o iPad incorpora o oposto exato de tudo relacionado à computação aberta como ferramenta criativa para a criação, compartilhamento e distribuição de música, imagens e conhecimento. Vejamos:

  • Trata-se de uma plataforma fechada. Tal como acontece com o iPhone, desenvolver aplicações para o IPAD significa depender totalmente das ferramentas da Apple, e do uso do software e hardware proprietários da Apple apenas para construir um app. Tais sacrifícios podem ser justificados no caso de um grande produto. Mas a questão é que a distribuição das aplicações também depende da Apple, que é quem decide quais os desenvolvedores de aplicações serão autorizados a criar – algo que nunca aconteceu em um sistema operacional de computação. Desde o lançamento do SDK do iPhone, os apaixonados pela Apple argumentaram que de alguma forma isso teria sido uma decisão forçada pelas operadoras de telecom, e que certamente a sua amada a Apple não tinha culpa. No entanto, a Apple escolheu esse caminho para um dispositivo que, apesar de não apresentar um teclado, tem todas as funções de um computador – algo que poderia ter sido um Mac, com todo o poder e a liberdade de um Mac, em vez de um iPhone vitaminado.
  • Não tem portas padrão. Tal como o iPhone, o iPad tem apenas um conector proprietário, assegurando à Apple o controle sobre o hardware feito para o dispositivo. Você pode jogar fora décadas de aulas sobre o valor dos conectores padrão, sobre a possibilidade de se utilizar um computador como um hub digital — para usar uma expressão popularizada pela Apple. Saída de vídeo será possível, ainda que com um adaptador proprietário. Mas o acesso a essa porta de vídeo via software tem sido um enorme problema no iPhone. Além disso, as possibilidades de uso hardware externo não foram totalmente esclarecidas. A Apple vai oferecer um leitor de cartão de memória da placa que usa USB. Mas não há uma porta USB nativa na máquina, e isso não necessariamente sugerem suporte completo para USB, esperemos, mais detalhes surgirão.
  • Está ligado ao iTunes. Tal como acontece com o iPhone, você não pode usar o hd do iPad como um hd. Você não pode se conectar a um computador e colocar nele o que você gosta. Você está limitado à utilização de aplicativos como condutores ou servidores – e, mesmo assim, você tem ações limitadas; arquivos críticos de mídia e leitura são controlados pela toda poderosa iTunes App Store. O iPad acaba sendo um dispositivo de armazenamento que você possui, mas que outro alguém controla. Talvez isso seja aceitável para os consoles de jogos, mas, novamente, o iPad tem a aparência de um computador. (Exceto, claro, que na verdade não é.)
  • A Apple controla toda a distribuição de mídia. A Apple já tem uma posição perigosamente dominante no mercado de música e software móvel, e seus dispositivos acorrentados ao iTunes garantem que todo o conteúdo passará por sua loja online, pelos seus dutos, enfim, tudo sob o seu controle. Isto significa que os desenvolvedores estarão limitados no que eles podem criar para o dispositivo quando se trata de mídia – um app de streaming da Last.fm é bom, mas uma loja de música independente (como a Amazon MP3 no Android) não o é. Adicione a isto o cenário da Apple dominando a distribuição de livros. No momento em que temos a oportunidade de promover a publicação independente de e-books, surge o iPad acompanhado por promoções de lançamento de grandes editoras tradicionais. O que isso significa para os escritores e produtores de conteúdo independentes? Um sinal positivo é que a aplicação da Apple suporta o formato aberto epub. Nos próximos dias e meses, vamos avaliar como isso funciona, e como interage com outros aparelhos.
  • Não é um computador aberto. Não é um Mac. A questão de fundo: você não pode realizar os procedimentos básicos que uma experiência de computação aberta permite. Você não pode conectar o hardware que você deseja, desenvolver ou executar o software que você quer, ou experimentar a liberdade que um computador oferece. Isso não quer dizer que uma tablet, uma slate, uma pad, ou o que você quiser chamá-la precisa ser exatamente como outros computadores. Pelo contrário: se você acredita na experiência de computação, sabe que deve trabalhar os aspectos de design de forma nova e criativa. (Houve um tempo quando o laptop em formato de mala que se fecha foi uma idéia nova, em um tempo em que os computadores eram tijolos gigantes que conectado a uma TV.)

Limitações podem ser necessárias. Sistemas operacionais especializados em telefones celulares fazem sentido. Mas o que temos no iPad é uma decisão de design do projeto – define a interface, as ferramentas de programação, e o hardware. Um dispositivo móvel como o iPad poderia muito bem funcionar sem estar preso ao iTunes, ou contando com portas e conectores do mundo real.

Nota: Em momento algum eu digo que a alternativa a uma iPad tem de ser em código aberto. Sou um grande fã do código aberto e do software verdadeiramente livre. Mas em relação ao que temos acima, o Windows pode ser considerado aberto.