A 'crise de relações públicas' que o Facebook enfrenta no momento é o assunto do dia no ambiente digital. Alguns movimentos na rede estão propondo o êxodo em massa dos usuários, ou a alternativa de utilizar soluções livres, em virtude de alterações automáticas e não autorizadas nas configurações de privacidade do mais utilizado serviço de rede social do planeta.
danah boyd postou na última sexta-feira uma 'descompostura' pública nos donos do serviço -- texto que já se tornou um clássico da rede [Facebook and "radical transparency" (a rant)] --, e colocou a questão de forma objetiva:
"A batalha em curso não é sobre o futuro da privacidade e da publicidade na rede. Trata-se de um debate sobre a livre escolha e o consentimento informado. Esta questão se torna evidente neste momento porque as pessoas estão sendo enganadas, traídas, coagidas e confundidas, sendo levadas a fazer coisas cujas consequências não estão claras. O Facebook segue dizendo que facilita a escolha do usuário, mas isto não é o que acontece. Os usuários têm a impressão de que estão escolhendo, mas os detalhes do que realmente acontece estão longe de seus olhos, 'para o seu próprio bem'."De fato, o caso Facebook traz à tona uma conversa muito oportuna e que demonstra uma evolução, uma maior consciência dos netizens em relação às novas dimensões inauguradas pelo ambiente digital em rede. Neste caso, o que está em discussão é como configuramos a nossa presença neste novo mundo -- que informações queremos tornar públicas, a quem, e quando. Algo comparável com a roupa que escolhemos para vestir em cada situação do mundo analógico. A pergunta é: deve uma empresa ter a prerrogativa de formatar as nossas escolhas on-line?
No mesmo dia em que danah boyd descascava o Zuckerberg (dono do FB), o NYTimes publicava artigo chamando a atenção para a natureza aberta da própria web ('World's Largest Social Network: The Open Web'), em contraste com a experiência enclausurada que Facebook e outras redes sociais comerciais oferecem:
"Em seu site, o Facebook diz que sua missão é 'proporcionar às pessoas o poder de compartilhar e tornar o mundo mais aberto e conectado'. Mas o mundo on-line fora do Facebook é um lugar já muito aberto e conectado, muito obrigado. Páginas web, blogs, reportagens e twitadas são densamente interligadas e estão disponíveis para todos e qualquer um. Em vez de contribuir para este mundo inteconectado e aberto da web, a crescente popularidade do Facebook está drenando-a da atenção, da energia e dos posts que estão disponíveis à visita pública.""O que gostaria de ressaltar é que, na perspectiva de quem acompanha de perto o cenário da cultura digital brasileira, este debate parece um dejavu. A minha tese é de que este momento que os usuários internacionais / norte-americanos agora vivenciam em relação ao Facebook, já foi experimentado por aqui ainda em 2006, quando o fenomeno orkut atingia no Brasil indicadores de uso absolutamente impressionantes.
Em janeiro de 2008 postei aqui no blog um manifesto que desafiava os orkuteiros brazucas a experimentar trocar as "facilidades (funcionalidades integradas da rede social) por autonomia inteligente" , e (re-)lançava a campanha "troque seu orkut por um blog", idealizada originalmente pelo colega Roberto Taddei.
"Acredito que a escala da experiência brasileira com o Orkut nos coloca à frente das tendências globais em termos de redes sociais. Explico: o que os norte-americanos experimentam como novidade hoje [jan/2008] com o Facebook -- a sensação de que 'todo mundo está lá' -- já acontece entre nós com o Orkut há pelo menos 2 anos. Ou seja, considero que estamos em melhores condições de enxergar como estes silos e 'jardins murados' (walled gardens) constituem uma enorme perda em termos de oportunidades na web, e assim optar pelas possibilidades que certamente irão explodir em 2008 (!)."Em 2010, brasileiros seguem realizando experiências concretas de uso qualificado da rede, algumas delas acontecendo em plataformas públicas. A rede 'culturadigital.br' configura um exemplo em atividade, oferecendo blogs e espaços livres para debate e formulação colaborativa de políticas públicas para o setor. Entre outras iniciativas hospeda o debate público aberto que formula o 'Marco Civil da Internet' no Brasil, que está entre os mais avançados arranjos técno-políticos para se formular um conjunto de princípios e direitos para os cidadãos na rede -- e trata, entre diversos temas, de privacidade.
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