O FCC americano regulamentou em 4 de novembro último que aparelhos capazes de receber o sinal da TV digital (DTV) deverão implementar tecnologias de controle de conteúdo requeridas pela indústria do entretenimento, de forma a restringir o uso do aparelho e a manipulação do conteúdo. Se não for questionado, o mandato da "broadcast flag" irá vigorar a partir de 1º de julho de 2005.
Isto significa que todos os aparelhos de TV vendidos nos EUA serão equipados com um circuito eletrônico que irá procurar, nos programas que você recebe em seu aparelho, por uma pequena marca eletrônica (flag). Se a marca estiver presente, sua TV entrará em modo especial de "alta-segurança" que desativará as saídas (outputs) digitais de alta qualidade. Se você quiser gravar um programa com a "flag", terá que fazer em fita analógica ou em um DVD especial de baixa resolução.
A EFF está processando o FCC:
"O mandato da DTV é um passo na direção errada porque iriá fazer a TV digital custar mais, e não menos, desestimulando a inovação, o uso justo, e a competição", disse Fred von Lohmann, Consultor de Propriedade Intelectual da EFF, "O FCC ultrapassou os limites de sua atuação, restringindo indevidamente consumidores e a indústria com a criação da "broadcast flag".
Isto nos recorda do ano de 1978 quando a Universal Studios moveu ação contra a Sony, afirmando que o aparelho de vídeo-cassete Betamax poderia seria usado para piratear ilegalmente filmes transmitidos pelas ondas do ar. Caso não houvesse acontecido a vitória da Sony, não teria acontecido a revolução das camcorders, as produções de vídeo amador, e a proliferação do cinema independente, e Hollywood também não teria produzido as receitas do mercado de aluguel de vídeos - lucrando pesado com a tecnologia que tentou eliminar.
Como afirma Lawrence Lessig, em seu já clássico artigo na Wired (extraído de seu novo livro, "Free Culture: How Big Media Uses Technology and the Law to Lock Down Culture and Control Creativity"):
"Se pirataria significa o uso da propriedade criativa de outros sem permissão, então a história da indústria de conteúdo é a história da pirataria. Todo e qualquer setor importante da mídia hoje - filme, música, rádio e TV a cabo - nasceu de alguma forma de pirataria. A história se define pela forma como cada geração se comporta com os piratas da nova geração. Assim tem acontecido - até hoje."
"A indústria do cinema, as TVs, comercial e a cabo, e o rádio, além de fazer uso liberal do domínio público por longo tempo, são filhos bastardos da pirataria, tendo se apropriado do conteúdo existente para seus próprios fins e sem nenhuma permissão específica. Como é sempre o caso quando evoluímos da revolução para a instituição, quando a classe operária ocupa o castelo, imediatamente sobe a ponte levadiça atrás de si."
Aqui no Brasil a classe operária ocupou o castelo, e creio que ainda não subiu a ponte levadiça. Cabe ao governo ficar atento às questões ideológicas que permeiam as regulamentações tecnológicas, principalmente na implementação da TV digital. É certo que esta tecnologia irá sacudir inúmeros setores da economia e pode, em ação articulada com os projetos de inclusão digital, alavancar um salto na inovação tecnológica e na produção cultural nacionais. É preciso que tenhamos a ponte da cidadania firme em seu lugar, permitindo livre acesso ao castelo. Algo assim como o Projeto Olido.
Update Via LigaNóis: Mais sobre o Projeto Olido no wiki Articuladores (plantas e fotos).